sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Agenda

Andava a noite. A noite estava mais fria. O cerrado estava queimando em algum lugar. Quando se respira fundo, andando na rua de madrugada, se sente o cheiro de queimado no ar. Auto-combustão. Para o cerrado, o fogo é condição de vida. Existem espécies que só floreiam após queimadas.

Um pé após o outro, eu vencia a distância que teimava em separar o ponto de partida do destino. Encontrei uma quase amiga também taciturna. Ela vendia a agenda do PSTU. Essa agenda talvez tenha sido a melhor coisa que o PSTU fez pelo Brasil. Várias vezes, desde a época de faculdade, já me surpreendi absorto, lendo suas frases muito bem selecionadas, suas pinturas, fotografias, esculturas e pensando sobre várias delas. Muitas vezes isso salvava um dia ebulímico.

Comprei agenda. “É trinta reais”, disse a quase amiga. “Não tenho essa grana agora”, respondi. “Não tem problema, pega logo a tua depois tu me dá o dinheiro”. “Fechou” disse eu, colocando a agenda na mochila.

No decorrer do caminho, agora novamente só, fiquei pensando no que escreveria na agenda. Preencheria os “dados pessoais” assim que chegasse ao tal destino? Deixaria em branco até que existisse, para mim, um mínimo de certeza sobre quem sou e o que quero para esse espaço de tempo (afinal ou é espaço ou é tempo, que porra é essa que chamamos de espaço de tempo?!) que vai se chamar 2010.

2010. A agenda continua em branco...Confesso: esses dias têm sido vorazes em consumir meu tempo, tenho somatizado as demandas que chegam. 2010. Agenda em branco. Pé após pé. Outra esquina. O sinal abriu. Continuo andando. E a agenda em branco.

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